Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

quinta-feira, 25 de junho de 2020

A Capela de S. Luís da Serra

* Victor Nogueira

O 1º aniversário da Mariana foi no Parque de merendas da Capela de S. Luís da Serra, onde há muitos anos não ia, cujo acesso pela EN 10 ostenta uma tabuleta avisando tratar-se de propriedade privada, mais um dos antigos lugares de picnics que foram sendo "privatizados", alguns mesmo com arame farpado, como no Caminho Municipal 1056.

Um trilho britado e sinuoso, por vezes muito íngreme. conduz-nos a meia-encosta, até chegarmos ao frondoso parque de merendas e ao miradouro da Capela, de onde se avistam por entre os cabeços da Serra da Arrábida, o Estuário do Sado e a península de Tróia.

O templo está imaculadamente caiado de branco, com barras azuis, e adossado ao mesmo o coreto mais tosco que alguma vez vislumbrei, com a porta de acesso ao interior arrombada, deixando entrever materiais de construção.  No parque os bancos e as mesas são de madeira, estas cobertas com azulejos.

Na meia encosta as ruínas de duas habitações, uma delas com um registo de azulejos. Os pastores vindos dos campos de Azeitão e das baixas de Palmela rumavam outrora até Setúbal para mercadejar o gado. descansando e refrescando-se junto à Ermida de S. Luís, protector dos animais.

Daqui avistam-se as serranias da Arrábida, os vales férteis, a cidade ao fundo. Hoje quase abandonados, são percursos serranos difíceis de fazer a pé, permitindo aos afoitos vislumbrar paisagens diversificadas que no cume alcançam Lisboa, Setúbal e os estuário do Tejo e do Sado.

E ao longe o mar-oceano de onde regressavam os pescadores que da pequena ermida avistavam a lanterna e ouviam o sino como sinal de chegada em segurança à barra de Setúbal.

Este é local de romaria e sobre ela fala José Nobre  em texto sobre a  festa de São Luís da Serra que se transcreve de seguida:

Este é local de romaria e sobre ela fala José Nobre  em texto sobre a  festa de São Luís da Serra que se transcreve de seguida:

«No domingo seguinte à Páscoa, comemora-se a Pascoela e é nessa altura que acontecem os tradicionais festejos junto à capela de São Luís da Serra, implantada num maciço calcário, em pleno Parque Natural da Arrábida, às portas de Setúbal, dando-se assim início aos tradicionais círios e romarias setubalenses.

Daquele local com vista desimpedida para toda a península de Setúbal e vale do Tejo o convívio entre os festeiros é o mesmo que agregou em torno da antiga capelinha os seus antepassados. Porém, a forma e as diversões do século XXI são naturalmente diferentes.

Longe vão os dias das grandes cavalhadas em que os homens montados nos seus burros mostravam a sua destreza e de olhos vendado tentavam, com um varapau, partir uma bilha de barro, pendurado num dos grandes pinheiros mansos.

Passados vão os tempos em que dali partiam, ao final do dia, os felizardos a quem eram atribuídas gordas galinhas pelo seu desempenho nos jogos populares.

E também longe vão os tempos em que boa parte dos festeiros entravam em Setúbal, pelo Rio da Figueira, trocando as pernas devido à enorme bebedeira e com o corpo cheio de arranhões devido aos trambolhões que davam ao descer a serra, fruto daquele vinho tinto de Palmela que dava volta à cabeça dos romeiros.

Neste aspeto a tradição já não é o que era e hoje o convívio faz-se ao som da música de um qualquer artista popular contratado para o efeito ou de algum rancho folclórico. Para servir o povo está instalado um quiosque que vende bolos, sandes, sumos, cervejas e águas engarrafadas.

Há meio século ainda acorriam àquele lugar, a partir da cidade e das aldeias e vilas envolventes, a pé ou de burro, grandes multidões que levavam os seus farnéis e se dispunham a passar um bom dia de convívio a pretexto de homenagearem o protetor dos rebanhos.

Conta a lenda que certo dia andando um pastor com o seu rebanho de ovelhas deixou tresmalhar os animais.

O dia chegou ao fim, a noite caiu e o rapaz preocupado invocou São Luís da Serra para o ajudar a encontrar os animais perdidos, prometendo-lhe ofertar um fato quando fosse homem.

Pouco depois, escutou o balido das ovelhas e identificando o local onde se encontrava as foi buscar e levou-as em segurança ao redil.

Quanto ao fato que prometeu oferecer a São Luís não se sabe se o teria mandado fazer ao alfaiate ou se ficou por costurar por falta das medidas adequadas.»













O terreiro e parque de merendas









o mira-sado









a capela e o coreto








Festas e romarias que que persistem na área do Município de Setúbal, para além de S. Luís da SerraSenhor do Bonfim (Setúbal, Maio), São Pedro de Alcube (Aldeia Grande, Junho), Nossa Senhora da Arrábida (círios de Azeitão e Setúbal, Julho), Nossa Senhora do Rosário de Troia (Agosto), Nossa Senhora da Conceição (Aldeia da Piedade, Azeitão, Agosto), Nossa Senhora da Saúde (Vila Fresca de Azeitão, Setembro).


2 comentários:

Nads disse...

Boa tarde, quando entrou pelo caminho através da N10, ainda não havia o portão? Ontem tentei ir a essa capela, e vi o acesso pela N10 mas ao passar pelo local vi que meteram um portão! Obrigada

Victor Nogueira disse...

Tinha o portão, mas estava aberto, quando lá fomos.