Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Porto: a rua Fernandes Tomás, entre o Bolhão e o Campo 24 de Agosto

* Victor Nogueira


Na,minha adolescência e juventude percorria a pé e com trajectos diversificados os percursos entre as casas dos meus avós António, na Rua dos Bragas, e Luís, primeiro na Rua Santos Pousada e posteriormente na Fernandes Tomás. O meu avô paterno era quimico-analista num laboratório na Rua de Santo Ildefonso e muitas vezes íamos a um café no Largo do Padrão, comprando os jornais numa tabacaria na D. João  IV,  ou ler para o Jardim de S. Lázaro, ali a dois passos do Largo dos Poveiros e da rua  Passos Manuel e do Coliseu ou da Praça da Batalha e seus cinemas. Ambos moravam perto dos empregos, pois o meu avô António era guarda-livros no BNU,  na Avenida dos Aliados.

Regresso hoje à Fernandes Tomás. Passa das 19 horas e muito comércio ainda está de portas abertas. Poucas modificações encontro, salvo um enorme Centro Comercial (ou Shoping), o Plaza Center. No cruzamento com a movimentada Rua de Santa Catarina, agora pedonal, a capela das Almas está de cara lavada, isto é, com os azulejos historiados limpos, com ar leve, sem aquele ar soturno, pesado e triste que outrora ostentavam as igrejas da urbe granítica, muitas das quais com as fachadas cobertas de azulejos contando "histórias" para edificação dos passantes e dos fiéis.

Faço no metropolitano o percurso entre o Mindelo e a Fernandes Tomás, no Porto. Na ida embrenhado na re-leitura de "A Oeste Nada de Novo", de Erich Maria Remarque, e no regresso, já noite cerrada, atento ao que ao meu redor se passava; o ondear sinuoso das carruagens, o casal chinês com o miúdo ao colo do pai, a mãe semi-adormecida, miúdo que num balanco do comboio se desiquilibra e se magoa de encontro ao carrinho de bébé. Os orientais raramente sorriem, transportando aquele ar sério e para nós imperscrutável. Defronte a mim, sentados, um casal jovem, ela absorta, com ar vagamente sério e triste, a cabeça encostada ao vidro, inclinada e apoiada na mão, o braço flectido, olha  para o negrume para lá da janela; a páginas tantas ele debruça-se sobre ela, que permance indiferente, ele força beijos mas ela retoma com ar contrariado e ausente a posição anterior, de olhar para fora da carruagem. Ele sai antes do Mindelo, ela prossegue talvez para a Póvoa de Varzim, com o mesmo ar distante, frágil e ausente, sem sorriso ou gesto de agrado.

As estações do metro no Bolhão e no Campo 24 de Agosto estão a grande profundidade, Naquela um painel de azulejos ilustra cenas do mercado vizinho, recuperado, enquanto no Campo as estações rmitiram pôr a descoberto um edifício,  centenário de séculos, onde existiu a “Mãe d’ Água de Mijavelhas”, que na ribeira, à entrada da “Estrada para Valongo e Além”, de “Chafariz” do Fernão Lopes passou a “Arca” dos Homens-Bons do Porto Renascentista” e de “Arca” a “Reservatório do Campo Grande”  

Segundo a Wikipedia a arca de água de Mijavelhas, de origem medieval, servia para proporcionar o abastecimento de água à cidade, captando mananciais de água para levar às fontes e chafarizes da cidade, onde os águadeiros se abasteciam. O topónimo Mijavelhas é uma designação pitoresca que teve origem, segundo uma antiga tradição, por ser ali que as mulheres se "aliviavam" quando vinham de Valongo e São Cosme à cidade, para vender produtos agrícolas e pão nas feiras de São Lázaro.

Quanto ao Mercado do Bolhão, construído no século XIX em zona de expansão da cidade, Segundo a Wikipedia as suas origens remontam a 1839, quando a Câmara do Porto decidiu construir uma praça em terrenos adquiridos ao cabido. Neste local existia um extenso lameiro, atravessado por um regato que ali formava uma bolha de água, de que resultou o nome do mercado,'Bolhão'. Alguns anos depois, esta praça foi melhorada com a construção de rampas de acesso e barracas de madeira no corredor central do mercado. Esta construção foi em 1914 substituída pelo actual edifício, num projecto desenhado pelo arquitecto Correia da Silva. Tratou-se de uma obra de vanguarda para a época, devido à utilização do betão armado em conjugação com estruturas metálicas, coberturas em madeira e cantaria de pedra granítica. Nos anos 90 do passado século o edifício foi remodelado e posteriormente iniciou-se um movimento cívico contra a sua demolição, defendida pela empresa concessionária invocando razões de rentabilidade económico-financeira. A empresa concessionada defende a demolição de todo o interior do mercado e a sua substituição de acordo com um, programa contempla a construção de habitações de luxo e de um centro comercial, deixando apenas cerca de 3% da área total do Mercado do Bolhão para o comércio tradicional.






RUA ALEXANDRE BRAGA








RUA FERNANDES TOMÁS
















capela das Almas, no cruzamento com a rua de Sta. Catarina








à direita, o muro do jardim do palacetre do banqueiro Pinto de Magalhães

CAMPO 24 DE AGOSTO







arca de água no antigo Campo de Mijavelhas 




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