Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Carnaval e Carnavais

* Victor Nogueira

em torno do Carnaval

(2013.02.12)

Mais uma máscara, neste Carnaval de 2013 que em Setúbal pregou a partida à meteorologia não despejando catadupas de água,

Nunca apreciei o Carnaval que era tema de redações do estilo O Carnaval, A Primavera ou "Que queres ser quando fores grande" Não me recordo de alguma vez ter-me mascarado, quanto muito apenas uma caraça. Nas redações lá vinha a inevitável referência "à carne a vala", da folia que antecedia a quaresma das cinzas até à 6ª Feira Santa - em que se não podia ouvir música, antes meditar na Paixão e Morte de Cristo, Nosso Senhor que ressuscitaria em grande no Domingo de Páscoa, aquele em que pelo menos uma vez no ano se devia comungar.

Mas retornando ao Carnaval, sempre me causou uma certa perplexidade que em Portugal, sociedade machista de pegas, toiros, engates e mulheres submissas ao estilo faduncho do "Não Venhas Tarde!", de Carlos Ramos, homens pretensamente másculos se disfarçassem de mulher. Do que recordo do Carnaval são as criancinhas mascaradas e das brincadeiras estúpidas e de mau-gosto, como atirar farinha, ovos ou urina para cima dos transeuntes. Farinha que em Luanda se lançava na rua ou para dentro dos automóveis, obrigando-nos a fechar os vidros e trancar as portas

Em Luanda havia também corsos carnavalescos indígenas, animados e multicolores, que foram proibidos após o início da guerra colonial em 1961.

Não me lembro de haver corsos carnavalescos em Portugal antes do 25 de Abril como hoje existem, uma caricata e tola imitação do Brasil, onde nesta altura está sol e faz calor - como em Luanda, enquanto que em Portugal está frio e muitas vezes chove, obrigando as "corsantes" quase despidas a tiritarem e baterem os dentes, como assisti uma vez na Moita, em tarde de frio e chuva..

E "prontus", amanhã tiro as máscaras e volto às fotos de perfil habituais.

O poema que se segue foi escrito em Sousel e não em Évora.

Pesquisando na net nada encontrei - nem fotos nem filmes sobre o carnaval em Luanda antes da independência. Devo ter por aí fotos do Turismo de Angola da altura, mas não dá para procurar agora. Encontrei apenas este curto filme sobre o Carnaval na Ilha de Moçambique, nos anos 60 do passado milénio.


Ilha de Moçambique, anos 60, Carnaval no Macuti

Ah! Também encontrei filmes sobre o Carnaval de Ovar da mesma época.

Notas soltas
(2010.02.15)

[15-02-2010 20:21:24] : Aqui tem chovido e feito muito frio, mas anteontem esteve um dia cheio e sol
.[15-02-2010 20:22:04] : Os cortejos carnavalescos é que devem estar lindos:
[15-02-2010 20:23:13] : as mulheres vão nos carros alegóricos quase despidas, como se estivéssemos no trópico sul e devem tremer de frio e encharcadas e os carros desfeitos
[15-02-2010 20:24:07] Em Portugal é agora hábito organizar os carnavais como no Brasil.
[15-02-2010 20:24:59] : Alguns têm muita fama, como os de Ovar e de Torres Vedras
[15-02-2010 20:27:15] : Agora no Brasil e em Angola faz muito calor mas aqui na europa faz frio
[15-02-2010 20:31:43] : Aqui as pesssoas mascaram-se e atiram farinha e ovos para cima das pessoas
[15-02-2010 20:32:39] : Os ovos é uma estupidez, pois as pessoas ficam todas sujas e por vezes com a roupa estragada
[16-02-2010 16:06:53] : Afinal não  fui a Lisboa. À última da hora apercebi-me que ainda não é  4ª feira, mas  sim 3ª feira, último dia de Carnaval.


Tempo de Carnaval
 (2010.02.17)

É já noite. Terminou o Entrudo e amanhã já é 4ª feira de Cinzas. O tempo tem estado frio, cinzento e chuvoso, pouco apropriado a festividades e cortejos carnavalescos macaqueados do Brasil. Lembro-me dum ano em que fui à Moita, numa tarde fria de inverno e as moças, em trajes reduzidos, bailavam ao som da frialdade. Talvez me dê para colocar no Galeria & Photomaton vídeos do Carnaval em Ovar e em Torres Vedras. A este assisti uma vez quando a caminho das Caldas da Rainha me vi forçado a parar devido aos condicionamentos do trânsito automóvel durante o desfile. Talvez de ambos os carnavais tenha fotos que ainda não estão digitalizadas.

Em Setúbal houve desfile no Parque das Escolas ou de José Afonso, ao qual o Rui assistiu com a Susana, duma das janelas da casa dele. Eu fiquei em casa, que o tempo esteve desagradável. Mas no sábado, pelas ruas e no Centro Comercial do Jumbo as crianças andavam mascaradas.

Em Luanda no Carnaval atiravam fuba (farinha) às pessoas, pelo que andavam com os vidros dos carros fechados, ou esguichavam-nas com água. Para além disso havia os cortejos carnavalescos, feitos pelos negros dos musseques, que foram proibidos após o início da guerra em 1961 e que agora foram retomados. Aqui em Portugal há a mania de atirarem com ovos para cima das pessoas; um ano ia a passear com uma amiga minha, em Oeiras, e ela ficou com o cabelo todo empastado e o fato estragado, pelo que acabou então o passeio.

E pronto, a conversa por hoje está feita, com a sugestão de algumas hiperligações para posts relativos ao Carnaval.



Um Carnaval na Amareleja, 1973
(1973.04.02)

O quarto onde tenho dormido em casa do senhor Cachopo - o da frente - é barulhento. ([1]) Toda a noite se ouvem motorizadas roncando e homens cantando com todas as cordas vocais desafinadas. Numa das vezes ouvi cantar os versos duma das canções dos "ensaiados", no Carnaval. (MCG - 1973.04.02)

No Porto, 1963
(1963.02.24 a 27)

À tarde fomos todos dar uma volta, a pé. Diverti-me imenso. Em casa, com duas pistolas de água, estivemos a guerrear-nos. (…) As ruas estavam cheias de aficionados do S. L. Benfica e do F. C. Porto, que hoje jogavam non Porto. Este último perdeu por 2 x 1, cedendo o comando da classificação ao primeiro (Diário III 1963.02.24

Fui a casa do avô Luís passar o dia. À tarde ele, eu e as minhas tiasinhas fomos lanchar ao Café Astória. A Maria não foi. Depois de chegarmos a casa continuei a minha guerra com pistolas de água, com a Maria. ([2])  (Diário III 1963.02.26)

É hoje o último dia de férias do Carnaval. Falei, pelo telefone, com a Maria. (Diário III 1963.02.27)


Em Luanda, 1959
(1959.02.10)

Mascarei-me de “cowboy”. vesti as minhas calças à “cowboy”, camisola às riscas, um lenço ao pescoço, máscara e um cinto com uma pistola. O cinto e a pistola tive no Natal.

O Zé não se mascarou.

(…) Depois andámos a ver a animação que reinava pelas ruas. Mas que era pouca, porque ameaçava chover. Um rapaz forçou o vidro da nossa carrinha e atirou com fuba lá para dentro.

(…) Ontem à tarde também vi dois mascarados. Um deles levava uma máscara preta, uma toalha verde a tapar-lhe a cabeça, umas calças remendadas, uns trapos a embrulharem as mãos, um casacão e um cajado. O outro levava uma máscara de gato, um chapéu de palha, umas luvas até aos cotovelos, umas calças com um pano multicolor, uma tábua e um saco roto com latas vazias. Eles iam de tal maneira mascarados que nem sequer se via a cor da pele nem os cabelos, para ver se eram brancos, pretos ou mestiços.  (Diário II, 959.02.10)

Outras visões


(2013.02.12/13)

Ana Albuquerque Apesar de não ser apreciadora da época carnavalesca, sempre te digo que nos anos 60, o Carnaval do Estoril era muito badalado e tinha carros bem mais produzidos do que alguns que agora desfilam. As vedetas convidadas eram quase sempre actrizes francesas ou italianas.



Victor Nogueira Olá, Ana Albuquerque Um Carnaval aos pulinhos, esse de 1964, como os filmes mudos Bjos :-)
Clara Roque Esteves Olá amigo. Eu também nunca fui fã do Carnaval. Recordo, na juventude, os meus bailes de garagem com os amigos do MEU GRUPO. (sempre vivi muito em grupo...). Fazíamos uns disparates banais, dançávamos e nada que não fizéssemos em outras circunstâncias. Dos tempo de África nem memórias tenho do Carnaval. Depois...sorte porque as minhas filhas também nunca foram fãs. Portanto, o Carnaval era uma oportunidade de sair de Lisboa e passar esses dias fora. O fotógrafo não está mal. Obrigada pela partilha. Ah, este Carnaval foi igual aos outros, apenas um encontro de família, conversa e conversa...
Victor Nogueira Clara Roque Esteves e Ana Albuquerque Pesquisando na net nada encontrei - nem fotos nem filmes sobre o carnaval em Luanda antes da independência. Devo ter por aí fotos do Turismo de Angola da altura, mas não dá para procurar agora. Encontrei apenas este curto filme sobre o Carnaval na Ilha de Moçambique, nos anos 60 do passado milénio.

Ah! Tb encontrei filmes sobre o Carnaval de Ovar, da mesma época.



Clara Roque Esteves Amigo, por acaso visitei a Ilha de Moçambique nos anos sessenta, fora da época carnavalesca. Honestamente não registei memórias de Carnaval em África e vim de Moçambique entre os 17 e os 18 anos, como já te disse. Frequentava desde os 15 discotecas ou bailes de garagem. Por cá, o mesmo programa. O Carnaval foi sempre pretexto para férias. Obrigada pelo video, vou abri-lo agora. Beijinho.
Manuela Silva Na minha infância e juventude, Carnaval era a véspera da Quaresma, que aí vinham 40 dias de silêncio, orações e terços, jejuns às sextas, e carne quase nenhuma durante esses 40 dias. E pronto. Carnaval era o dia em que se podia exagerar em tudo, carne, vinho (para os adultos, claro), chegando mesmo a cometer o pecado da gula com prazer redobrado, pensando nas carências que aí vinham. Apenas assisti uma vez a um desfile fora de Portugal.
Nem música se podia ouvir durante a Quaresma, imaginem!
Clara Roque Esteves Manuela Silva, em Coimbra estive alojada num lar de freiras. Mas já estava na faculdade e elas não tinham hipótese de nos controlar... Vitor Victor Nogueira, já consegui ver o video da Ilha de Moçambique. Uma delícia enquanto recordação. Carnaval "à branco"...rásparta!
Judite Faquinha Eu nunca liguei ao carnaval, é uma brincadeira que não me diz nada...dentro dos meus trinta anos cheguei a mascarar-me para seis jovens poderem sair e aos bailaricos, eu ia e as mães deichavam-nas ir porque iam comigo e o meu marido!!! O filme da ilha de Moçambique na caça sub/ aquática, está linda adoro ver!!! tenho uma amiga de Moçambique!!! Eu hoje fui ver o carnaval a Setubal, e ao Pinhal Novo mas, não me diz nada os foliões não lhe acho qualquer graça bjs
Carlos Rodrigues Bom o enterro do Carnaval já foi no dia 12 e só hoje vi a tua postal fotografado fotografado em flagrante delito. Já Pessoa, com ou sem Carnaval, foi muitas vezes apanhado no Martinho da Arcada em " flagrante de Litro "...O Poeta tem ferramentas que nem a ferramenta sabe. A propósito nem todos os Carnavais Portugueses são Brasileiros, em Torres Vedras terra de boas cepas ainda se bebe do puro, quer dizer com matrafonas, caricaturas, Rei e Raínha Nacionais e esse Carnaval já vem do tempo da outra Senhora, é anterior ao 25 de Abril, a crítica social e os Corsos não vem de agora. Obrigado e diverte-te, o Carnaval continua...


Galeria Fotográfica



Carnaval em Luanda – postal ilustrado – CITA, anos ‘60


Rancho Folclórico da Cabeça Gorda (1976 Carnaval) (foto Victor Nogueira)




Luanda - 1958 Natal (fotos jj castro ferreira)


Porto – Coliseu dos Recreios – Carnaval (1967 03 24)


Évora, 1980  (foto Victor Nogueira)



Setúbal 1983 (fotos Victor Nogueira)





 Setúbal 1984  (fotos Victor Nogueira)


Setúbal 1985 (foto Victor Nogueira)





Setúbal e Palmela 1986 (?) (foto Victor Nogueira)



[1] Largo da Torre do Relógio, uma igreja arruinada
[2] - Trata-se da Maria Fernanda, que por essa altura se despediu, pois ia para a terra, em Pico de S. Cristóvão (Vila Verde) para cuidar da mãe, doente, que precisava dela. (Diário III pag 148).

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