Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

domingo, 29 de novembro de 2020

fontenários e chafarizes 15 - Carnaxide

 `Victor Nogueira

Aqui se referenciam os chafarizes, azulejados, da antiga freguesia de Carnaxide: nesta povoação e em Linda-a-Pastora. Se os painéis de azulejos que ornamentam os chafarizes de Linda-a-Pastora reproduzem cenas campestres, essas representações já nada têm a ver com a actual povoação, Por estas bandas residiram Cesário Verde e Camilo Castelo Branco.

Linda-a-Pastora


Fonte de Sant'Anna (rolo 218)


Chafariz junto à Capela de S. João Baptista - Rua Manuel Pereira de Azevedo (rolo 218)


Carnaxide
 



Chafariz, com um painel de azulejos e brasão de Oeiras, datado de 1952



Chafariz construído no século XVIII pelo rei Dom José depois do terramoto de 1755, constituído por um tanque rectangular e duas bicas, com o brasão real. - Rua 5 de Outubro, junto à Igreja de S. Romão


Linda-a- Pastora - Alcandorada na AE, pela encosta acima, mantém um ar de povoação rural, de edifícios em degradação, perdida no meio da auto-estrada e das vivendas que se vão construindo mais a cima. As ruas são estreitas, labirínticas, tortuosas, algumas simples becos ou pedonais de escadaria acima (ou abaixo), como na Alfama lisboeta, algumas conservando os nomes característicos de outrora Becos das Mouras, dos Namorados, dos Pombais e do Veríssimo, Travessas do Carambola, do Ferrador e da Bomba  (este terminando no Casal do Poço, mesmo ao lado da auto estrada) e Calçadas do  Lavra  e do Rei, Ruas do  Lavra e da Serra de S. Miguel,  Largo da  Bica. 

A meia encosta, com um pequeno adro, situa se a Capela de S. João Baptista, de traça simples e barras azuis, para além do quartel de bombeiros voluntários. As casas são ainda rurais e uma delas com uma data: 1848, possuindo outras registos de azulejos, actuais. Na rua do Lavra um cão, de ar triste e cara de urso, olha para a rua, o pescoço enfiado nas grades, não ladrando a quem passa. Sentada no poial duma casa uma velhota costura e resisto à tentação da fotografia. As Fontes de Santa Ana e outra no adro da Igreja possuem painéis de azulejos com cenas campestres.  

Mais para oriente, sobranceiras e ao longo da auto estrada, estendendo se até ao Santuário da Senhora da Pedra, muitas barracas e casas abarracadas. 

Foi esta uma terra de vistas aprazíveis, sobre o vale verdejante do Jamor, terra agrícola e bucólica, que se perdeu, não se ouvindo já quaisquer rumorejar das águas ou da folhagem, chilrear de pássaros ou chocalhar de animais; hoje, a paisagem são os carros passando velozes na auto-estrada, num rumor contínuo, vinte e quatro horas em vinte e quatro horas, em manobras por vezes mais ou menos arriscadas e enfeixando se uns nos outros. Cesário Verde, que por aqui deambulou, não encontraria já o bucolismo que descreveu nos seus poemas.  (Notas de Viagem, 1997

Carnaxide, a 5 km de Algés e 4 km de Queluz, foi outrora terra de trigais. A auto-estrada e o Estádio do Jamor destruíram o bucolismo do vale. Na Serra de Carnaxide existem respiradouros, mãe de água do aqueduto de Carnaxide, elementos visíveis da estrada, que também abastecia o aqueduto das Águas Livres. No centro da primitiva povoação destaca-se a Igreja Matriz de S. Romão e à roda desta igreja, no largo Almirante Gago Coutinho, estão as ruas tradicionais e as casas de quinta progressivamente integradas no espaço urbano, como a Casa de Saúde de Carnaxide, antiga Quinta da Igreja. O primitivo centro urbano está muito degradado e descaracterizado, persistindo designações de artérias como becos do Sapateiro, do Machado, Lavadouro, das Escadinhas,  as Travessas do Lameiro  e do 5 de Outubro, a Calçada do Chafariz, o Largo da  Pátria Nova, as Ruas  Portal das Taipas e do Portal das Terras. 

No adro da igreja de Carnaxide, arborizado, encontra se um coreto, sem coberto, e um chafariz, com um painel de azulejos e brasão de Oeiras, datado de 1952. Nas trazeiras deste encontra se um outro chafariz, este reconstruído na sequência do terramoto de 1755. Um portal duma antiga quinta ostenta ainda uma data do século XVIII. Na rua Visconde Moreira de Rey encontram-se a Casa Gabri, onde residiu Camilo Castelo Branco, e o Palacete da Quinta das Torres, revivalista, como se fora um castelo medieval, para além da Quinta do Morval, que outrora integrava as duas anteriores. (Notas de Viagem, 1997)

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