* Victor Nogueira
Com base na minha correspondência epistolar, extraído de
«Viagens, memórias e registos – Ibéria 01»
1968
Piscinas Municipais de Évora c. 1975– postal ilustrado VN
Se não me engano estas piscinas são das melhores da Península (ou da
Europa). Ainda não as visitei. Em Janeiro haverá um curso de natação. Vamos ver
se começo a praticar alguma actividade desportiva! É desnecessário enviar a
correspondência com “Porte Pago”. O nº do apartado é o 65 (seis, cinco).
Brevemente escreverei. As impressões são inúmeras, os correspondentes em número
razoável e a disposição literária escassa! É difícil dactilografar um postal!
Põe-se com fosquinhas. VêeM?! (NSF 1968.11.08)
1969
Imaginem uma ilha de pedra
escura ou casas irritantemente brancas
no meio de uma infindável planície. Imaginem umas muralhas que encerrem umas
relíquias sagradas, mais intocáveis que os "intocáveis". Imaginem umas igrejas velhas, escuras, uma
delas cheia de tíbias e caveiras e dois esqueletos pendurados na parede ([1])
E a encorajadora frase "Homem,
lembra‑te que és pó e em pó te hás‑de tornar". Uma janela manuelina, num
canto, num dos muitos cantos escusos, e que foi do Garcia de Resende. Um templo
romano, vulgarmente denominado de Diana. ([2]) Muralhas medievais e seicentistas. ([3]) Um aqueduto [da Prata] ou o que dele resta. E
casas, muitas casas, dolorosamente caiadas de branco, um branco frequentemente
maculado por umas escuras pedras graníticas, restos duma janela, duma porta,
duma parede, duma muralha... E ruas estreitas e tortuosas, onde passam pessoas
e carros. Évora, ei‑la, cidade sem presente nem futuro, com passado, um passado
que se pretende preservar a todo o custo. Aqui, se não fossem os automóveis e
as antenas de televisão, poder‑se‑ia dizer que o tempo parou. Algumas décadas
ou mesmo séculos atrás.
Que mais tem ela? Meia dúzia de jardins. As melhores piscinas da
Península. Um Salão Central Eborense".
Que dá sessões cinematográficas diariamente (à 6ª feira o filme é português).
Um
teatro (o Garcia de Resende) que
em dois meses abriu para apresentar um concerto, uma peça de teatro ("D.
Quixote", pelo Teatro Experimental
de Cascais), uma ópera ("Rigoletto", pela Companhia do Trindade). Um espectáculo de cada.
Que tenho feito? Andado por aí. Ir ao Instituto ouvir uns tipos a vomitarem sabedoria, uns, ignorância, outros,
presunção, alguns. Vender folhas atrás do balcão da Associação de Estudantes.
Ir bissemanalmente às piscinas [cobertas] nadar. Ouvir música, de rádio, pois o gira‑discos avariou‑se. Andar
por aí. Ler. Aborrecer‑me. Desesperar‑me. Angustiar‑me. Mas,... que interessa
isto?! Respiro, como, ando. Estou vivo! O resto, hum! o resto são cantigas. (MLCF
- 1969.02.23)
Finalmente e já não era
sem tempo, parece ter chegado o verão. Embora não esteja calor, o céu está
azul, com alvos flocos de núvens aqui e além. As piscinas, uma das coisas boas
que esta terreola possui, serão uma tentação na época de exames que
atravessamos. (...) Dentro de cinco dias abre a Feira de S. João, ao que sei muito apreciada pelo povo de Évora. A
tal ponto que o cinemazeco cá do burgo aproveita os quinze dias para férias do
pessoal. ([4]) (MLCF - 1969.06.17)
Piscinas de Évora e parque infantil com o avião Junkers 52 c. 1980 – postal ilustrado VN
Um outro aspecto das piscinas de Évora. Do lado esquerdo, o parque infantil, bastante interessante. Como não podia deixar de ser, já entrei no avião, que está muito estragado por dentro. Creio que foi transporte de paraquedistas.
Eis aqui um dos locais mais aprazíveis do burgo. Ao fundo, a cidade onde se destacam as torres da Sé. Em1º plano, parte do parque que se vê no outro postal. Depois, as diversas piscinas, desde a infantil até à dos saltos, passando pela olímpica. No edifício ao lado direito ficam um bar, os balneários e a piscina de inverno. O edifício mastodôndico é o Teatro Garcia de Resende. A seta indica o local onde fica o Instituto, junto à Sé. (MLCF 1969.06.17)
Piscinas Municipais de Evora – bilhete de entrada
O verão chegou finalmente, envolvendo a cidade num bafo quente e opressivo (NSF - 1969.06.28)
Évora, piscinas municipais – Tenho
saudades da praia.(…) Recebi uma
amável carta da Maria Arnalda convisdndo-me para um fim.de semana [na Figueira
da Foz]. Ainda não decidi onde passarei as férias. Talvez vá com os finalistas
[do ISESE] a uma viagem de estudo por Portugal (NSF 1969.11.27)
1970
Évora, Piscinas Municipais - Eis o Paraíso Eborense nestes dias de calor: cúmulo do azar: apanhei uma valentíssima gripe, insuportável. Remédio: doses maciças de antigripais. Recebi as massas de Julho e da PEU [Procuradoria dos Estudantes Ultramarinos] marcarei passagem para 5 AGO; confirmarei. Sairei de Évora 29 JULHO: (NSF 1970.07.21)
1971
Inaugurei hoje a minha época de piscinas. O tempo está quente e a água, embora fria, é agradável. (NSF 1971.06.17 - ?)
1973
Nas piscinas de Évora, com a Maria Luísa – foto MENS
(...) Na varanda das piscinas, em Évora, às 15:30. Está um dia quentemente abafado; nas ruas muitas saudações dos "amigos" e conhecidos que passam. Na boca um sabor amargo e de náusea. Detesto Évora. Pronto. Já disse. Poderei algum dia apreciar a beleza de Évora?
A máquina de dactilografar está já no carro. Daqui a pouco vou até ao Instituto para uma conversinha com o Pe. [Augusto] Silva. A minha Mãe escreve um postal ao meu pai - que tal como o Zé ainda não deu sinal de vida - enquanto a Maria Luísa "contempla" a paisagem. Trouxeram agora os cafés. O Manuel Prates está cá a tirar a carta. Saudades de todos (MCG - 1973.09.07)
Ontem andei de avião sobre Évora, que é uma cidade bestial lá de cima. Foi a 2ª vez que andei de avioneta na minha vida - a 1ª foi em Angola, tinha para aí uns dois anos. ([5]) Tirei umas fotografias (...). Aqui para nós, um pouco antes, quando o teco-teco começou a rolar na pista estava um pouco apreensivo, mas logo liguei à terra. Sobrevoámos a cidade, fomos a S. Bento, às piscinas, à Cartuxa, ao convento do Espinheiro. É bestial! (1974.12.23)
1975
Piscinas de Évora, c. 1980 – postal ilustrado VN
É tempo de verão e para os eborenses a piscina é a “praia”.(JJCF 1980.06.28)
[1]
- Igreja de S. Francisco
(Évora). Nas minhas deambulações encontrei outras “Capelas de Ossos”, como em Alcantarilha (Igreja Paroquial de Nossa
Senhora da Conceição), Faro (Igreja de Nossa
Senhora do Carmo) e Campo Maior (Igreja de S. Sebastião), sem esquecer a de
Monforte ((Igreja Matriz de Santa Maria da Graça) e do Porto (Igreja de S.
Francisco).
[2] - Situa‑se o templo no cimo da colina, conjuntamente
com a Sé, o antigo Palácio da Inquisição, o Convento dos Loios, a Biblioteca e
Museu Municipais, e o Palácio dos Duques de Cadaval, com muralha medieval e
pequeno museu, para além do jardim de Diana, sobre a muralha romana, com ampla
vista para os arredores. Pela rua 5 de Outubro ou da Selaria ia‑se para a Praça
do Giraldo.
[3]
- A base da colina em que assenta a cidade antiga é cercada de muralhas árabes,
romanas, medievais ou setecentistas, com as respectivas torres. Pelas Portas se
transitava, algumas com nome dos destinos: portas de Avis, de Alconchel, de
Moura, do Raimundo. Perto desta última se situava o jardim de Diana e dentro
deste o que resta do Palácio de D. Manuel, para além do coreto e das ruínas
encenadas por Cinatti ao gosto romântico e provenientes do paço do bispo
D.Afonso de Portugal. O jardim tinha por um lado acesso para o largo de
Mercado, onde se situavam a igreja de S. Francisco, com a sua capela dos Ossos,
e o Celeiro Público, e por outro para o
parque infantil, para a Praça de Touros e Rossio de S. Brás, onde se encontra a
ermida homónima , gótico mudejar, e se realizava a feira de S. João. Muito
conhecida, a capela dos ossos não é exemplar único, existindo em Faro, como se
referiu, Lagos e Campo Maior, para não falar na Boémias e em Itália, como em
Castel Gandolfo. À entrada da capela
eborense, do séc. XVII, uma inscrição: Nós,
ossos que aqui estamos, | Pelos vossos esperamos. De Cinati, o cenógrafo do
castelo de Leiria entre outras, é também
o Palácio Barahona.
[4] - No verão não se interrompiam as sessões
cinematográficas. Após a quinzena de férias, passavam a ser na esplanada, um
recinto sem cobertura.
[5]
Lembro-me apenas que fui ao colo do
piloto ou do co-piloto e do painel de instrumentos da avioneta. Só
muitíssimo mais tarde soube que nessa altura vivêramos durante cerca dum ano na
então vila de Carmona (Uíge), quando regressámos definitivamente a Luanda
Sem comentários:
Enviar um comentário