Publicada em 16/08/2010 às 20h29m
Leila Suwwan
SÃO PAULO -Mal chegou às bancas a edição da "Época" e a militância petista começou a se queixar da reportagem "Dilma na Luta Armada" - na capa, uma foto 3x4 de sua ficha no Dops de São Paulo mostra uma jovem abatida e desgrenhada, presa pela repressão aos 22 anos. Porém, qual não foi a surpresa desses mesmos petistas ao perceber que a ilustração interna da revista era uma versão estilizada da fotografia, que mostra a mesma jovem, desta vez bem delineada e carregada de tinta vermelha, destacando um olhar fixo, quase impetuoso. Rapidamente, internautas da base petista começaram a adotar a imagem, que já se alastra nos perfis doTwitter e deve ser usada em camisetas e outros materiais.
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Qualquer semelhanças com outros ícones da esquerda não são mera coincidência. O editor de arte da Época, Marcos Marques, explica a criação da capa, e a gênese da ilustração, desta forma: "Diante de uma foto com a importância histórica que esta tem, fica difícil conseguir algo melhor para colocar na capa. O que eu fiz foi melhorar o máximo a qualidade da foto 3×4, mantendo a originalidade. Para usar na abertura da matéria, pedi para o ilustrador Sattu fazer uma ilustração no estilo do Shepard. Gosto deste estilo que lembra os cartazes comunistas mas tem um tratamento mais atual, não fica tão antigo".
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Shepard, neste caso, é artista plástico norte-americano Frank Shepard Fairey, 40, criador da famoso litogravura de Barack Obama, com as letras garrafais "Hope" (Esperança). O retrato alçou Shepard à fama, foi utilizado extraoficialmente pela campanha do democrata, se tornou capa de revistas e entrou na coleção permanente da National Portrait Gallery - o próprio Obama agradeceu Shepard pela iniciativa e pela mensagem propagada.
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Vários perfis do twitter da militância de Dilma trocaram, a partir de sábado, suas fotos por variações do retrato de Dilma - inclusive alguns que participam de forma oficiosa da campanha, como o @dilmanarede e o @dilmanaweb. Neste último, consta ainda o recado, em 140 caracteres: "Não importa o que a história fez com uma mulher. O que importa é o que a mulher fez com o que a história fez com ela".
" De repente começou a ter muita procura da imagem, para usar na internet e também para fazer camiseta, imprimir, montar outros materiais "
- De repente começou a ter muita procura da imagem, para usar na internet e também para fazer camiseta, imprimir, montar outros materiais. Fizemos a vetorização (transformar o desenho em arquivo digital) e disponibilizamos gratuitamente na internet. Não li a matéria da Época. Disseram que era contra a Dilma, mas vamos usar o mesmo retrato para inverter isso - disse a designer Natália Proença Morassi, 23, da Gemini Arte.
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O blog petista "Amigos do Presidente Lula" já postou o retrato, com o título "Dilma ficou, Serra fugiu", reascendendo a polêmica sobre a atuação dos candidatos durante a ditadura - a petista foi presa e torturada e o tucano se exilou. Logo abaixo, uma aspa atribuída à candidata, que mistura um discurso antigo com o outro lado enviado à revista: "Eu não fujo quando a situação fica difícil. Eu não tenho medo da luta. Não participei de ação armada e sequer fui julgada por isso e sequer fui condenada".
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Outro blogueiro, Bruno Ribeiro, reflete sobre o "trunfo" que o retrato virou para a campanha do PT. "Minutos após a revista chegar às bancas, milhares de internautas em várias partes do país já se mobilizavam para reverter o sentido da imagem de Dilma veiculada na reportagem. A arte é sensacional: o traço do ilustrador é ótimo, o olhar de Dilma lembra o de Che Guevara e tudo remete aos famosos retratos em série feitos pelo papa da art pop, Andy Warhol (painel de Mao Tsé Tung)", escreveu Ribeiro.
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A campanha de Dilma Rousseff não gostou da reportagem. E nada indicava que os coordenadores tinham conhecimento do movimento de "inversão" do retrato.
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Questionado sobre a possibilidade de interesse no uso da imagem, o coordenador de comunicação, deputado Rui Falcão (PT-SP), foi lacônico:
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- Claro que não.
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Porém, o "guru web" da campanha já ensinava ontem como trocar a foto do Twitter por variações artísticas da Dilma "guerrilheira". Ou Dilma "guerreira", como prefere o marqueteiro João Santana.
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