Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

domingo, 19 de julho de 2009

Fotografo o que não vivi

11 Julho, 2009

Castro Prieto

© Castro Prieto


Fotografo o que não vivi

Sérgio B. Gomes
(P2, 11.07.2009)

.

Há quem se dedique a registar pela fotografia o ínfimo acontecimento, a marcha da pequena e da grande história que ficará agarrada a uma linha cronológica, a uma coutada geográfica. É um trabalho (necessidade) de classificação e de arquivo que (ainda) dá à fotografia esse estatuto tão especial de prova do que foi, de como, onde e com quem aconteceu. Diz-se documental esse registo que, com o mínimo de artifícios estilísticos, tenta reproduzir fielmente a realidade.
.
Há quem nos reproduza parcelas do mundo tal qual ele é - puro e duro. E há quem parta dessa frieza para registos que tocam um mundo mais onírico e fantasmagórico, mais mágico, intemporal - um mundo que contraria e que sujeita a história à poesia. É nesta linguagem fotográfica - muito mais ligada à atmosfera introspectiva do que à fidelidade do acontecimento - que assenta Estraños, a exposição com que o espanhol Juan Manuel Castro Prieto (Madrid, 1958) se apresenta pela primeira vez em Portugal na Kgaleria, em Lisboa.

.

Para quem construiu um percurso na fotografia sobretudo ligado aos rigores da técnica - Prieto é um dos mais exímios e reputados impressores de fotografia espanhóis com clientes como Chema Madoz, Cristina García Rodero e Alberto Garcia-Alix - não deixa de ser paradoxal que o conjunto de imagens que dão forma a Estraños assente em abordagens difusas, tanto na forma como no conteúdo, que resvala facilmente para a alegoria, para o lirismo literário. Paradoxal, mas também revelador de uma necessidade de enfrentar convenções e de encontrar diferentes maneiras de ver e fazer fotografia. Alejandro Castellote, comissário desta exposição apresentada pela primeira vez em Madrid em 2002, ano em que Prieto ganhou o prémio carreira do festival PhotoEspaña, elogia-lhe a atitude "coerente" em busca de "mundos oníricos a partir do quotidiano" e vê no "fatalismo" com que encara a vida um dos principais motores da sua produção fotográfica. Em resposta a Castellote, no catálogo de Estraños, Castro Prieto resume o resultado dessa procura assim: "Fotografo experiências que não vivi".

© Castro Prieto

.

.

in Blog

.

artephotographica.blogspot.com - Sérgio Gomes

.

.

Sem comentários: