Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Barcos avieiros no Rio Tejo


* Victor Nogueira



foto victor nogueira . barco avieiro no rio tejo, com motor fora de borda

PATRIMÓNIO: BATEIRA AVIEIRA, UM BARCO QUE É EXPRESSÃO DE UMA CULTURA EM RISCO
(...) “Percebemos que se há alguma coisa de particular e paradigmático na cultura avieira é o barco, porque é sobre o barco que assenta toda uma cultura: o barco era a casa, o sítio onde se criavam os filhos” e não um objeto solto, realçou à Lusa Luís Gomes, um dos dois antropólogos que viveram quatro meses na aldeia para fundamentarem a candidatura, no âmbito de um trabalho que envolveu mais dois antropólogos, uma historiadora e um assessor técnico.

Vítor Tomás, o único habitante da aldeia que continua a construir a bateira como aprendeu com o pai, contou à Lusa como a mãe “arrumava” oito dos seus 10 filhos para dormirem na metade da frente da embarcação, como tinham que aguentar os temporais que levantavam o toldo que lhes servia de abrigo ou como improvisavam colheres com pão quando as de lata não davam para todos comerem a sopa da ceia na mesa improvisada com um “paninho” no traste (tábua a meio do barco).

Com a mãe a remar e o pai dedicado às artes da pesca – feita à noite quando a água do Tejo não era suficientemente “barrenta” durante o dia para esconder as redes dos peixes -, os filhos por vezes eram deixados a dormir num mouchão (ilha) em baixo de um toldo de pano cru tingido com casca de salgueiro e pinho.

“O pescador antigamente, como se governava do Tejo, estava sempre perto do rio”, disse Vítor Tomás, contando que o barco deixou de ser a casa de todo o dia quando começaram a ser construídas “umas barraquinhas”, primeiro de palha e depois, para os que conseguiam um pouco mais de dinheiro, em madeira de pinheiro, colocadas por cima de estacas com um solho, dando origem às aldeias palafíticas do Tejo.

Foi com o pai que Vítor aprendeu a construir a tradicional bateira, da mesma forma que o pai aprendera com o seu pai, originário de Vieira de Leiria, de onde veio (para a aldeia da Palhota, no concelho do Cartaxo) numa das migrações à procura do sustento do rio, quando o mar revolto do inverno não permitia a pesca. A viver nas Caneiras desde o casamento com Eulália Pelarigo, gostaria muito de passar esse saber a quem com ele queira aprender.

Conseguir inscrever as artes e os saberes de construção e uso da bateira avieira no inventário do património imaterial é, para Luís Gomes, muito importante para a preservação de um conhecimento que tem no mestre Tomás uma representação viva.

“Não desaparecendo esse conhecimento, o objeto pode continuar a adaptar-se” às alterações do meio ambiente e das vivências de uma comunidade que, apesar das mudanças ocorridas ao longo dos anos (nomeadamente nas habitações), mantém “toda uma relação com o rio” ( ...)

http://www.mediotejo.net/patrimonio-bateira-avieira-um-barco-que-e-expressao-de-uma-cultura-em-risco/

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