Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

sábado, 9 de maio de 2020

Fortificações 21 - Forte de Peniche (1988)



Foto victor nogueira Forte de Peniche (1988) antigos pavilhões prisionais para confinamento político de alta segurança dos opositores ao regime fascista e dois poemas de Daniel Filipe..









O Viajante Clandestino, por Daniel Filipe
Este é o local, o dia, o mês, a hora. O jornal ilustrado aberto em vão. No flanco esquerdo, o medo é uma espora fincada, firme, imperiosa. Não espero mais. Porquê esta demora? Porquê temores, suores? Que vultos são aqueles, além? Quem vive ali? Quem mora nesta casa sombria? Onde estão os olhos que espiavam ainda agora? O medo, a espora, o ansiado coração, a noite, a longa noite sedutora, o conchego do amor, a tua mão... Era o local, o dia, o mês, a hora. Cerraram sobre ti os muros da prisão. ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~ o 1º de Maio de 1962, in Pátria, lugar de exílio, por Daniel Filipe Regresso pelo tempo ao dia de hoje primeiro de Maio de 1962 hora segunda da meditação Ganho de novo consciência do lugar chegam comboios há mais gente na rua como se o rio humano recebesse o agreste tributo de outra oculta nascente Vêm com o rosto de todos os dias o olhar de todos os dias as mãos e os pés de todos os dias cansados de preencher impressos moldar metais afeiçoar madeiras rodar motores e válvulas sujos de óleo e poeira deslumbrados de sol operários empregados de escritório vendedores de porta a porta dir-se-ia que cantam De súbito a cidade parece banhada de alegria estamos juntos meu Amor possessos da mesma ira justiceira Damos as mãos como dois jovens namorados e sorrimos felizes à doce primavera acontecida no magoado coração da pátria Vêm de toda a parte sem idade Redescobrem palavras esquecidas e no silêncio cúmplice desfraldam um novo e claro amanhecer do mundo

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