Autor da imagem mais reproduzida do pós-guerra fez da foto ofício poético
A foto de Robert Doisneau acima, que mostra um casal se beijando há 60 anos em frente ao Hôtel de Ville, em Paris, é carregada de nostalgia e de um olhar terno, características que marcaram o estilo do fotógrafo. Por ironia, Doisneau não foi treinado para desenvolver esse olhar subjetivo, mas registrar máquinas de forma objetiva - ele iniciou sua carreira como funcionário da Renault, fotografando carros. No entanto, seu famoso beijo, que já vendeu quase 500 mil cópias - recorde mundial de exemplares tirados de uma imagem original - é uma prova de que o trabalho jornalístico pode ser sinônimo do artístico e incorporar detalhes de uma história pessoal, como no ensaio sobre o comportamento dos jovens parisienses encomendado pela revista americana Life em 1950 e que resultou no beijo.
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Durante muito tempo circulou a versão de que os personagens dessa reportagem formassem um casal chamado Jean e Denise Lavergne - finalmente desmascarados como dois impostores quando surgiram os verdadeiros nomes dos protagonistas da história, Françoise Bornet e Jacques Cateaud. A história é fascinante: sentado num bar, Doisneau contemplava a paisagem em busca de inspiração quando topou com o casal. Ele, então, abordou os dois e descobriu que eram atores amadores, propondo em seguida que posassem para a legendária foto. A identidade do casal foi descoberta por meio de um número, 21.039, que identificava a foto do beijo nos arquivos do fotógrafo e foi presenteada pelo próprio Doisneau à linda Françoise Bornet. Um belo presente para o casal mais famoso da história da fotografia: o exemplar original valia há algum tempo mais de 20 mil euros.
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A carreira de Doisneau não perseguiu, porém, a meta publicitária hoje comum entre profissionais do ramo. Talvez seja por isso que não se encontra facilmente uma imagem contemporânea capaz de provocar tanto encanto e emoção quanto seus flagrantes de personagens anônimos em situações engraçadas, como o dos dois irmãos gêmeos que fazem acrobacias numa rua de Paris, em 1934, observados por outros dois garotos também vestidos com roupas absolutamente idênticas. Também por ela Doisneau já foi definido como um mestre intuitivo do absurdo e do incomum. Ele costumava dizer que a vida não era alegre e, justamente por esse motivo, o humor surge como uma espécie de refúgio "no qual a emoção que sentimos é aprisionado".
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Um olhar retrospectivo para essa história confirma as palavras do escritor, associando seu nome aos dos grandes humanistas da fotografia, especialmente o pioneiro Eugène Atget, que fotografava anônimos nas ruas parisienses no início do século passado, e Henri Cartier-Bresson (1908-2004), de quem se tornou amigo. Eram tão companheiros que, na cerimônia fúnebre de Doisneau, em 1994, Cartier-Bresson atirou ao túmulo do amigo a metade de uma maçã, comendo a outra metade, num gesto simbólico de fraternidade eterna.
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Ao contrário de Cartier-Bresson, que perseguia um ideal estético ligado à tradição pictórica, compondo suas fotos como quem pinta um quadro, Doisneau não parecia tão interessado no enquadramento como nos personagens das cenas que retratava. Não que ele desprezasse o rigor formal do amigo. Ao contrário. O fotógrafo conviveu com grandes personalidades do mundo intelectual francês como o poeta Jacques Prévert (é dele sua melhor foto, sentado ao lado do cão num parque parisiense em 1955), o cineasta Jacques Tati e o pintor Picasso. Mas foi com o amigo Robert Giraud que seu imaginário se desenvolveu, quando o reencontrou e este o conduziu como um Caronte pelo mundo dos humilhados e ofendidos da rua Mouffetard no começo dos anos 1950 - é dessa fase a foto do acordeonista cego (1951) na esquina, solitário e ignorado pelos passantes.
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Por tudo isso é compreensível que se recorde Doisneau em preto-e-branco, surpreendendo, portanto, a exposição de suas fotos em cores na Galeria Claude Bernard, em Paris. Nessa sua breve passagem pelos EUA há 50 anos, Doisneau, que detestava viajar, topou com o artificialismo de Palm Springs, mas também com figuras que os cineastas na nouvelle-vague francesa chamavam de gênios, entre elas o comediante Jerry Lewis, que fotografou durante uma filmagem. Lewis sempre foi a autocrítica bem-humorada da América que sonha as cores publicitárias da foto maior ao lado. O olho treinado de Doisneau logo percebeu que estava diante de um ícone - e o melhor que se tem a fazer diante dele é prestar reverência. Foi justamente o que fez.
assim como Henri Cartier Bresson . um grande artista !
ótima matéria merecemos mais livros dos grande homens da fografia editados aqui no Brasil ! é uma vergonha não temos quase nada ... um abraço a todos
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