* Victor Nogueira
2020 11 20 foto victor nogueira - Paço de Arcos - Chafariz do Canejo na Quinta do Torneiro
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chafarizes e fontenários 06 - Vila Fria (Porto Salvo)
2019 11 20 foto victor nogueira - obras em Santo Amaro de Oeiras (2017.09)
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tripalium em Santo Amaro de Oeiras
foto de família - porto - nº 44 da travessa da carvalhosa 1949/1950 -
Para além do escriba, os meus avós António, Alzira e Zé Luís e os meus tios José e José João, para além da minha mãe. Por exclusão, a fotógrafa deve ter sido a minha tia Lili.
Quando nasci os meus avós e seus filhos estavam em Angola, pois o meu avô Luís era quimico-analista na Fazenda Tentativa, de açúcar, no Caxito, nos arredores de Luanda. Tal como o meu pai o meu avô ficou "enfeitiçado" por Angola mas a vida não lhe permitiu que para lá regressasse. Na altura da foto o meu tio José João tinha retornado ao Porto para tirar o curso de arquitectura, tendo regressado a Luanda em 1956, pouco depois de concluí-lo. Nesta altura ainda chegou a dar aulas na Escola Industrial e Comercial de Setúbal, no ano em que ela passou do Largo da Palmeira para o Parque do Bomfim, a mudança feita por professores e alunos. Nesta mesma escola o meu pai e eu demos aulas, ele depois da independência de Angola, eu depois de terminar o curso de sociologia, contrariado pois nunca gostei de ser professor, proissão transitória que larguei mal pude. Mas o meu pai e o meu tio gostavam de dar aulas - em angola o meu pai nunca havia sido professor mas era um bom explicador de mim, qd tinha tempo para isso..
Depois do meu nascimento a minha avó Francisca insistia com a minha mãe para que mandasse o "menino" para o Porto, para juunto dela, mas faleceu antes de nos conhecermos. Existe apenas em resultado das memórias da minha mãe e do que dela a restante família me contou.
A casa tinha dois pisos e um grande quintal nas tazeiras onde havia criação - muito gostava eu de ver os coelhos nas gaiolas com o narizito a tremer e os olhos enormes ou aos saltinhois ziguezagueantes assim como os pintainhos amarelos partindo a casca do ovo e logo começando a andarilhar.. Para além da criação de animais havia uma enorme nogueira (produzia grandes nozes) e uma latada, cujas uvas a minha avó vendia para fora. A economia doméstica era complementada com o cultivo de batatas, alhos, couves e cebolas plantadas no referido quintal.
Toda a vida o meu pai não comia carne de coelho apesar dos castigos da Alzira pois em miúdo afeiçoava-se a eles e não podia vê-los no prato. Nesta altura a minha avó Francisca - que não conheci - e por quem o meu avô está de luto, que manteria toda a vida - já havia falecido.. Nesta foto falta o triciclo, que surge noutras. Tirando o meu avô Barroso, nunca ninguém na família pôs luto pela morte de familiares - o luto sempre foi e tem sido considerado pessoal, íntimo, não carecendo de exteriorização.
ELEGIA PELA MINHA FAMÍLIA DISPERSA
Meu avô António Barroso
sobrinho de Bispo
de S. Salvador do Congo e do Porto,
a quem puxaram as barbas nos alvores da República
filho de lavradores abastados de Barcelos
casado jovem
guarda livros num banco
passando noites somando
intermináveis colunas de cifras
e o dinheiro que faltava para tantos filhos.
Meu avô, quando jovem, tinha nas fotografias
um ar austero e severo
sempre de preto
viúvo.
Meu avô, já idoso
um ar jovem e sereno
um sorriso moço e tímido
uma fala mansa
um gesto amigo.
Minha avó, Francisca da Conceição, de Chaves
não conheci
casou mais velha
falava francês e tocava piano
alegre e generosa, dizem-me.
Minha avó trocou o convento pelo casamento
mas antes deixou os bens aos padres
das Oficinas de S. José,
Encontraram-se no Porto e muitos filhos tiveram
que não conheci senão minha mãe
e meu tio Zé Barroso
grandiloquente e folgazão
curioso e letrado.
Minhas tias Marias Almira e José
Meu tio Joaquim
estes só conheço das recordações da minha mãe
Meu avô Zé Ferreira
nascido em Mora
filho de comerciante ribatejano
Meu avô quimico-analista
alegre jovem despreocupado
que em menino me levava ao café
e de quem recebia o Pim Pam Pum e o Cavaleiro Andante.
Meu avô que eu adorava e amo.
Minha avó Alzira gorda e doméstica
no seu colo me refugiava quando
à janela o homem do saco aparecia
na Travessa da Carvalhosa.
Minha avó morreu era eu menino em Luanda
e meu pai chorou ao volante da carrinha.
Tiveram três filhos: Manuel Lili e Zé João.
Meu avô casou novamente
com a Alexandrina
e nasceram a Isabel e a Teresa
irmãs que não tive.
Meu bisavô centenário
que me teve no colo e conheço da fotografia
na cadeira do quintal sentado.
Meu tio Jorge, em S. Tomé
(não) conheci
em Évora companheiro de estróina do Zé Ferreira.
Minha tia Esperança. farmacêutica no Chiado
das primeiras mulheres na Universidade
minha amiga que não mais verei
partida em Janeiro de 84.
Minha tia Lili, modista em Paço de Arcos
minha confidente da juventude
minha amiga.
Meu tio Zé João, a calma em pessoa
hoje arquitecto em Chaves
tão longe
amigo da infância e da adolescência.
Meus tios não casaram
Apenas meus pais em Cedofeita se encontraram
e para Angola partiram.
Meu avô António viveu sempre na Rua dos Bragas
Meu avô que mandou fazer uma casa no Mindelo
perto da praia e de Vila do Conde
com um quarto para o neto quando o fosse visitar
a casa fechada e abandonada
porque morreu em tempo de Páscoa.
Meu avô Luís viveu com os filhos em muitas terras
até em Angola onde nasci.
Meu avô Barroso católico ferrenho
apóstolo ingénuo
mas que depois de Abril aceitava os comunistas.
Meu avô Luís agnóstico
livre pensador e tolerante
que não aceita os bolcheviques.
Meu avô Luís que não vejo senão tão espaçadamente.
Meus primos de Barcelos
o Manuel o Joaquim a Laurinda
a Deolinda a Celeste a Cândida
e tantos outros
tímidos uns
alegres rosados e folgazões outros
Meus primos espalhados pelo mundo
pelo Brasil Alemanha Venezuela e terras de França.
Minha família grande e dispersa
conhecida e desconhecida
que a vida e a morte têm separado
Perdidos cada vez mais
na bruma dos tempos e da memória!
setúbal 1985.11.13
2013 11 20 Foto Victor Nogueira - Sernancelhe - - Igreja Matriz
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Uma Photographia por si só vale por mil palavras?