domingo, 21 de junho de 2020

Cela - Monumento a Humberto Delgado

* Victor Nogueira

Regresso à Cela Nova, cuja igreja dedicada a Santo André revejo pormenorizadamente, apercebendo-me também do seu pelourinho e do edifício do antigo celeiro. Sigo por outros caminhos em busca de Cela Velha; a povoação tem um ar de abandono, mas a visão de Cela Velha é ainda mais deprimente, embora paradoxalmente pareça mais recente: situa-se no fundo duma descida aprazível mas interminável e, quase no seu termo, uma placa partida indica a existência dum monumento. Lá ao fundo um largo, alguns edifícios degradados, uma bomba de gasolina, a  estação do caminho de ferro e um segundo monumento, tal como o primeiro dedicado a Humberto Delgado. Estranho estes dois monumentos a Humberto Delgado: o primeiro avista-se perfeitamente do largo da estação, lá em cima, a meia encosta.

(...)  Uma carrinha e uma caravana de automóveis atroam os ares em propaganda eleitoral, mas não consegui distinguir se eram da  CDU se do CDS/PP. Damos uma volta, mas tudo é desolado e em breve um operário (Ilídio Neves), despedido duma fábrica da região, contar-nos-à a explicação do Humberto Delgado, que afinal tinha ali uma quinta, donde saíra na véspera a idosa viúva por causa do mau tempo. 

O monumento, uma iniciativa do Rancho Folclórico e Etnográfico “Papoilas do Campo”, cuja autoria é do escultor alcobacense José Aurélio, resultou dum concurso público e do trabalho das populações sendo inaugurado em 22 Agosto 1976: uma série de gomos desagregam-se por acção dum ariete que me parece um cravo estilizado. Nos gomos destruídos palavras adjectivantes do fascismo: obscurantismo, mordaça, repressão, mentira, castração, medo, humilhação, violência, colonialismo, ódio, opressão, exploração. Lá em baixo na Praça, os dois blocos representam "o estilhaço impelido pela força indómita da liberdade."

A herdade da família Humberto Delgado - Quinta da Cela Velha - era uma granja, pertença dos monges de Alcobaça, situando-se a casa, recente, no cimo duma encosta, daí se avistando o fértil vale, outrora braço de mar, e as elevações em redor. Para lá dos portões, que franqueamos em visita proporcionada pelo sr. Isidro Neves, uma capela, despojada, a Ermida de S. Bento, donde foram retiradas as peças de valor, substituídas por estatuetas modernistas de autoria dum dos filhos do general.  (Notas de Viagem, 1997.12.08)

«A Quinta de Cela Velha era uma das mais antigas quintas das granjas dos Monges de Alcobaça, que teve carta de emprazamento em 1431, pertencendo à família Andrade e Gamboa desde 1571. A capela, dedicada a São Bento, que ainda hoje integra o território da quinta, é referida pelos autores setecentistas como uma das mais antigas do reino, mas foi remodelada na primeira metade do século XVIII. Assim é mencionada nas Memórias Paroquiais de 1758, cujos dados foram confirmados em 1774 pelo cronista da Ordem de Cister, Frei Manuel de Figueiredo.
É possível que este restauro ou reedificação tenha sido patrocinado por António de Andrade e Gamboa, aqui sepultado em 1776. A inscrição tumular refere ainda o seu filho Francisco João de Macedo e Andrade, falecido em 1804.

A capela, de linhas muito depuradas, apresenta fachada principal em empena triangular e sineira do lado esquerdo sobre os cunhais. É marcada pela abertura do portal de verga curva, e pelo brasão de armas dos Andrades. No interior, e para além do nicho de madeira sobre o altar-mor, ganha especial interesse a pedra tumular já referida, com data de 1817.» in .692.Quinta da Cela Velha, da família Humberto Delgado, foi de novo assaltada...


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Fotos em 1997.12.08
rolo 211
   

Ver   Cela (Coutos de Alcobaça)

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