* Victor Nogueira
(texto e fotos)
Da esquerda para a direita, isto é, de Norte para Sul, a carta regista entre outros lugares, Esposende, Vila do Conde, Azurara, Mindelo, e S. João da Foz (do Rio Douro)
A partir dos finais do século XV Vila do Conde e Azurara tornam-se importantes estaleiros navais de embarcações que por esse mar fora rumaram em busca dum mundo desconhecido para a maioria dos europeus de então. Concomitantemente desenvolve-se o comércio marítimo com o Norte da Europa (Flandres) e com o Ultramar, o que conduz à criação da Alfândega Régia, inicialmente dependente da do Porto e depois autonomizada, em acerbo confronto com os direitos senhoriais das freiras do Convento de Santa Clara, no processo de centralização do poder real iniciado por D. João II.
Se no Porto e na Idade Média a burguesia se aliou ao Bispo para contrariar o poder da nobreza, que nas outras terras se aboletava à custa da burguesia, dela se alimentando e das mulheres deste se servindo como direito de "sangue", em Vila do Conde a burguesia, como em muitos outras localidades, aliou-se ao rei e à sua política centralizadora para se libertar da tutela da Igreja, no caso, da Abadessa do Convento de Santa Clara. onde se acolhiam e professavam mulheres da nobreza. Tal era a força da burguesia que no Porto os nobres não podiam construir palácios nem permanecer por mais de três dias.
O crescente desenvolvimento do tráfego comercial provocou ao longo do sécuulo XVIII sucessivas ampliações no edifício primitivo. Contudo, no século XX, desactivado, foi ocupado pela Guarda Fiscal e utilizado como armazém pelos estaleiros navais que desde a era de quinhentos neste local se situavam. Em 2001, como resultado da candidatura de Vila do Conde com o projecto “Rosa dos Ventos” o edifício é totalmente reabilitado e convertido em espaço museológico.
A exposição permanente patente ao público, ilustra três aspectos: a história da Alfândega Régia e seu funcionamento, oficiais e produtos desalfandegados; a história da Construção Naval, tipos de barcos construídos em Vila do Conde e respectivos processos construtivos, incluindo maquetes de embarcações e amostras dos inúmeros produtos desalfandegados. Manequins espalhados pelo espaço representam as várias profissões que desenvolviam a sua actividade na Alfândega, da fiscalização das mercadorias, despacho, taxação e registos contabilísticos.
Fundeada desde 2007 nas águas do rio Ave, a réplica da Nau Quinhentista, foi executada em conformidade com as investigações científicas da responsabilidade do Almirante Rogério d’ Oliveira, incorporando o saber ancestral dos carpinteiros e calafates dos estaleiros vilacondenses. A Nau Quinhentista apresenta os aposentos de alguns dos tripulantes, assim como os próprios elementos da tripulação, através de esculturas humanas: o capitão, o piloto, o escrivão, o capelão, o boticário, o timoneiro, o bombardeiro e o grumete. Para além disso nela estão expostos vários instrumentos de navegação, material cartográfico, diferentes tipos de mercadorias, uma botica, procurando elucidar sobre a complexidade e as vicissitudes da vida a bordo.
Ao contrário do galeão, embora maior que a caravela, as naus eram espaços exíguos e apertados, desconfortáveis, com amplos porões para armazenamento de mercadorias, água e víveres, Nela se representam quatro camarotes/camaratas, dois deles com a respectiva enxerga, sendo um deles o do boticário. A marinhagem, excluindo os oficiais e o padre, anafado, deveriam dormir em qualquer recanto do navio. Transportavam pedras para servirem de lastro e estabilizarem o navio no alto mar.
Muito próximo dos núcleos museológicos Alfândega Régia – Museu de Construção Naval e Nau Quinhentista, a Casa do Barco é um espaço dedicado à mostrar a importância das actividades piscatórias e de outras de vocação marítima. A presença da réplica de uma embarcação de pesca tradicional - o gasoleiro - é o motivo central da exposição, onde, para além de podermos contactar com as tradições ligadas às comunidades marítimas, aprestos e alfaias do quotidiano, observamos, simultaneamente, diversos modelos de embarcações, com destaque para um importante acervo fotográfico, documentando as diferentes actividades económicas relacionadas com o mar.
Entre o Cais dos Assentos e o Cais da Alfândega, no cimo dum maciço rochoso encontra-se a Capela de N. Sra do Socorro, anteriormente designada como Ermida de N. Sra da Boa Viagem, ela também ligada às actividades marítimas, edificada em 1559 por iniciativa de Gaspar Manuel, "piloto-mor da carreira da Índia, China e Japão que custeou as obras" conjuntamente com sua mulher Bárbara Ferreira de Almeida, ambos nela sepultados. O templo distingue-se pelo seu formato e cobertura, semelhante à de templos orientais por onde estanciou o seu patrono. O edifício é de planta circular e elíptica, formada por dois corpos,dos quais, o mais pequeno está curiosamente orientado para Meca. Interiormente está decorada com notáveis azulejos do século XVIII, representativos da vida de Cristo, bem como para o retábulo de estilo rococó.
Não posso deixar de reparar como a Igreja domina esta zona: imponente, lá em cima, isolado, impositivo, o na altura medieval Convento de Santa Clara, de que subsiste apenas a Igreja, com os túmulos da fidalguia, donatária e beneficiária de rendas e dízimos, incluindo a travessia de barca, cuja manutenção cabia no entanto aos habitantes da Vila. Mais abaixo e em confronto, face a face, num maciço mais modesto, mais ao rés-do-chão, num bairro de gente ligada à pesca e à construção naval, um templo mais simples mas dissonante relativamente ao que se lhe opõe, com a sua arquitectura influenciada pelos contactos com novos/outros Mundos, os de Ásia, e outras religiões, como a maometana, com uma capela virada a Meca, construído também para albergar os túmulos dos responsáveis pela sua edificação, não senhores feudais dum mundo em desaparecimento, mas do mundo novo que surgia, virado para fora, no caso um piloto-mor da Carreira da Índia, de cuja ciência dependia em grande parte a segurança da viagem e o chegar a bom porto. Com efeito, o primitivo nome foi de Ermida de N. Sra da Boa Viagem, que teve de ser alterado por existir já na manuelina Igreja matriz de S. João Baptista (1502/1518 e 1573) uma capela com idêntica invocação, construída em 1542 pela comunidade de mareantes de Vila do Conde,
Contígua aos Cais dos Assentos encontra-se a Praça D. João II, projectada pelo Arqº Siza Vieira, com alguns símbolos dos Descobrimentos, como os Padrões, as Esferas, um gigantesco Relógio de Sol e a Sereia (do Escultor José Rodrigues). Para poente encontram-se os terrenos onde se fazia a seca do bacalhau, de que falo em Vila do Conde - entre a seca do bacalhau e santa catarina das areias in http://kantophotomatico.blogspot.pt/2016/09/vila-do-conde-entre-seca-do-bacalhau-e.html
pormenor do mural de homenagem às mulheres da seca do bacalhau, da autoria de Isabel Bruno
Sereia (do Escultor José Rodrigues)
fotos em 2016.09.23
Toda esta zona ribeirinha incluindo a Capela do Socorro já foram objecto dum post meu anterior:
Vila do Conde quinhentista e ribeirinha in http://kantophotomatico.blogspot.pt/2016/09/vila-do-conde-quinhentista-e-ribeirinha.html
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Capela de N. Sra do Socorro
Azurara - Convento de S. Donato
Convento de Santa Clara
Alfândega Régia
maquete do edifício
Nau quinhentista
Capela de N. Sra do Socorro
Alfândega Régia
bombardeiro
capelão
timoneiro
grumete e bombardeiro
capelão
botica e boticário
Visita Virtual à replica da Nau quinhentista em Vila do Conde clicando in http:// www.360portugal.com/ Distritos.QTVR/Porto.VR/vilas.cidades/ Vila_Conde/ NauQuinhentista.html
Casa do Barco
Rio Ave
selfie ao pôr-do-sol
Marina
Miscelânea
Restaurante Doca - ementa
Capela de N. Sra do Socorro e Cais dos Assentos
Avenida Júlio Graça
fotos em 2016.11.05
Acabei o passeio com chave d'Ouro.
ResponderEliminarObrigada, Victor.
😘
Acabei o passeio com chave d'Ouro.
ResponderEliminarObrigada, Victor.
😘