* Victor Nogueira
Santa Catarina, Évora de Alcobaça e Turquel foram vilas e sedes de concelho nos Coutos de Alcobaça, vasto território cedido por D. Afonso Henriques ao Mosteiro de Alcobaça. Neste imenso território, com portos marítmos privativos, onde o Abade e a justiça do Mosteiro tinham mais poder que a d’El Rei os monges desbravaram as terras inóspitas desenvolvendo uma próspera agricultura com métodos inovadores. Cada uma das 14 vilas tinha o seu pelourinho, símbolo da independência e autoridade administrativas, com cartas de foral doadas sucessivamente pela Abadia e por D. Manuel I. Com a reforma administrativa de 1836 as vilas perderam a sua autonomia, sendo como freguesias incorporadas nos concelhos de Leiria, Alcobaça e Caldas da Rainha.
Santa Catarina
Por esta povoação passara na vez em que fôramos à Benedita comprar umas botas. Na altura era uma fiada de luzes avistada numa curva da encosta, lá em baixo no vale. No largo principal, chamado do Pelourinho, situa se uma igreja modernizada, com alteres de talha dourada ("outrora é que era bonita", conta me um velhote ilustrado com outros dois sentado num banco), o pelourinho, a antiga casa da Câmara, um solar setecentista (com uma capela arruinada), para além dum modesto jardim com caramanchões e um fontenário. Passeio pelas ruas e registo os seus nomes: o Beco do Moinho e as ruas do Lagarão, do Jardim, do Arsenal, do Paiol, do Caixeiro, Direita e da Índia. Deparo com muitas casas arruinadas e outras para venda.
Entre as várias histórias referidas pelo velhote, que tinha lá em casa um livro assinado contando histórias da região, registo a que se refere ao Casal do Coito (?!), onde eram acolhidas as crianças sem pai nem mãe, para além de esclarecer que a forca se situava num cabeço fronteiro, fora da vila, mas que constava que ninguém fora lá executado.
Foi esta uma vila importante, embora a importância seja relativa ao tempo e à era; com efeito, em 1527 teria ... 31 moradores na vila e 69 no termo, possuindo até 1834 duas Companhia de Ordenanças para manter a ordem!
Évora de Alcobaça
Por maus caminhos, a corta serra, acabamos por chegar a Évora de Alcobaça, depois de passarmos por uma povoação incaracterística, Vimeiro, que foi granja do Mosteiro num vale aprazível.
Mas é de Évora que falaremos e esta foi uma povoação importante, conservando ainda o pelourinho e duas igrejas com portas manuelinos, tendo a matriz de Santiago o Velho, sobre uma porta lateral, um baixo-relevo medieval representando Santiago Mata Mouros. Na igreja mais pequena, da Misericórdia, na fachada a Sul, um pequeno portal maneirista ostenta uma pequena caveira.
A rua principal tem alguma simpatia e da toponímia registo as ruas de Cima, do Norte, Nova e do Outão.
O tempo não deu para nos arredores visitar nem o Convento de Santa Maria Madalena, nos Capuchos, fundado pelo Cardeal D. Henrique., nem o Arco da Memória, no alto da Serra dos Candeeiros, situado nos limites das freguesias de Évora de Alcobaça e do Arimal, a uns quilómetros da Portela do Pereiro, nem o lagar fradesco das Antas.
Igreja da Misericórdia
«Évora, teve Misericórdia como o prova o alvará de 21 de Março de 1517, pelo qual D. Sebastião mandou anexar o Hospital de Évora à respectiva Misericórdia, mas a data da sua fundação é desconhecida. O Hospital e a capela anexa eram de invocação do Espírito Santo, culto esse muito divulgado e venerado nos Coutos de Alcobaça.
Apresenta um belo portal manuelino com motivos vegetalistas e uma espécie de máscaras carnavalescas no arco canopial que o encima.» (1)
Prosseguindo a viagem a corta mato, para sul, deparamos com Turquel, outrora denominada Villa Nova de Turquel, com prédios modernos, altos, e com mais vida, nos cafés - parece uma povoação mais cosmopolita e modernaça, até no trajar das pessoas. Contudo é uma povoação menos simpática que a anterior, com o pelourinho perdido no meio de casas sem história. A Igreja matriz de N. Sra. da Conceição, mandada edificar pelo Cardeal D. Henrique, tem um portal manuelino mais pobre e não conseguimos nela entrar, apesar dos cânticos que se ouvem, pois as portas interiores encontram se aferrolhadas. Entre esta e o largo do Pelourinho situa-se a Capela do Senhor do Hospital, da antiga Misericórdia. Nela existe um crucifixo carbonizado que segundo a lenda teria sido deixado por um mendigo que por uma noite se albergara e desaparecera sem deixar rasto. Aliás lendas não faltam na região, relacionadas com mouras.
Na íngreme e calcetada rua da Neta persistem algumas casas rurais, duas delas com escadaria exterior. Registo outros nomes como o do largo do Pelourinho e as ruas do Relego, Principal e do Outão.
Daqui seguimos de novo para norte, rumo a Alcobaça. (Notas de Viagem, 1998.02.08)
Fotos em 1998.02 e 1999.08 (rolos 224 e 400)
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Uma Photographia por si só vale por mil palavras?