Escrevivendo e Photoandarilhando por ali e por aqui

“O que a fotografia reproduz no infinito aconteceu apenas uma vez: ela repete mecanicamente o que não poderá nunca mais se repetir existencialmente”.(Roland Barthes)

«Todo o filme é uma construção irreal do real e isto tanto mais quanto mais "real" o cinema parecer. Por paradoxal que seja! Todo o filme, como toda a obra humana, tem significados vários, podendo ser objecto de várias leituras. O filme, como toda a realidade, não tem um único significado, antes vários, conforme quem o tenta compreender. Tal compreensão depende da experiência de cada um. É do concurso de várias experiências, das várias leituras (dum filme ou, mais amplamente, do real) que permite ter deles uma compreensão ou percepção, de serem (tendencialmente) tal qual são. (Victor Nogueira - excerto do Boletim do Núcleo Juvenil de Cinema de Évora, Janeiro 1973

domingo, 27 de setembro de 2015

sombras na casa do mindelo

* Victor Nogueira


foto victor nogueira - sombras na casa do mindelo

O trabalho deles é fotografar arquitectura


João Morgado, José Campos, Fernando Guerra, Ivo Tavares e Luís Ferreira Alves viajam pelo país e pelo mundo para fotografar arquitectura. Ficam sozinhos com a obra, estudam-na sem a máquina e depois retratam-na, sempre à procura de novas perspectivas (e aqui entram, também, os drones). Ser fotógrafo de arquitectura é uma profissão com saída em Portugal

Texto de Ana Maria Henriques • 24/09/2015 - 12:37 mir 
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João Morgado
“A minha base é o meu carro”, garante ao P3 João Morgado, 30 anos, fotógrafo de arquitectura desde 2007. Começou “por acaso”, ainda durante o curso de arquitectura — profissão que nunca chegou a exercer — e agora já conta com quase 600 reportagens fotográficas no currículo. É em viagem, de Sever do Vouga para o Porto, onde vive, que Morgado fala da recente distinção da publicação “Top Teny”, que o incluiu na lista dos 10 melhores fotógrafos de arquitectura do mundo. Estão lá as imagens tiradas do ar, com recurso a drones, da Piscina das Marés em Leça da Palmeira (de Álvaro Siza Vieira) e do Parque Tecnológico de Óbidos (de Jorge Mealha), dois trabalhos que o fotógrafo considera terem tido um “alcance diferente e especial”. Gosta de fotografar para mostrar ao público um edifício “o mais próximo possível da realidade”, sem romantizar ou “espectacularizar a obra”. O ideal é quando consegue surpreender o arquitecto com um novo ponto de vista, “sempre em trânsito” e a conhecer arquitectura nova. Bragança, Aveiro, Lagos e Sardenha, na Itália, são os próximos destinos.

José Campos
Estudou arquitectura mas nunca foi arquitecto e a culpa é da fotografia. José Campos, 34 anos, prefere o prazer de fotografar um edifício a ter de o conceber. Procurar uma perspectiva nova em obras que demoraram anos a concluir é um desafio. Em 2012, ementrevista ao P3, considerava-se um “fotógrafo do mundo”, com um trabalho “muito solitário” que exige “dedicação contínua”. Tudo isso se mantém — sobretudo os “dias doentios”, em trânsito ou à espera do momento ideal para fotografar. O Arquipélago – Centro de Artes Contemporâneas, na ilha açoriana de São Miguel, foi um dos edifícios que mais gostou de fotografar nos últimos tempos. Continua a trabalhar na Alemanha, como já tinha referido há três anos, mas Portugal é o melhor mercado (e onde não lhe falta trabalho, “felizmente”). Para breve está a divulgação das fotografias da Casa do Rio, a nova extensão do hotel Quinta do Vallado, no Douro.

Fernando Guerra
O “Archdaily” apelidou-o de “um dos mais proeminentes fotógrafos de arquitectura” quando viajou com os arquitectos Álvaro Siza e Carlos Castanheira pela Ásia, em 2014. Foi uma “viagem histórica”, contou Fernando Guerra ao P3, dois meses depois de ter regressado. “Tenho o melhor arquivo do Siza de sempre. (…) O lado pessoal, que eu consegui nos últimos anos, para mim não tem preço”, revelou na altura o fotógrafo de 45 anos. No site Últimas Reportagens, Guerra lista quase 900 reportagens, em 15 anos de trabalho a partir de Lisboa. Para Álvaro Siza há uma secção especial, onde consta o trabalho fotográfico do “Edifício sobre a água”, construído sobre um lago artificial em Huaian, na China. Mas há outros arquitectos de renome, portugueses e não só, cujas obras foram retratadas por Guerra: Manuel Graça Dias, Gonçalo Byrne, João Luís Carrilho da Graça, Paulo Mendes da RochaARX Portugal, Mário Kogan e Zaha Hadid (só para mencionar alguns). “Entre os edifícios que fotografa não se percebe, exactamente, um juízo de valor sobre os conteúdos da arquitectura; antes um controle, ao nível das emoções, que busca homogeneizar todos os registos”, lê-se no site.

Ivo Tavares
Estar sozinho com a obra é o que Ivo Tavares mais gosta na fotografia de arquitectura. “Só tens que controlar a luz, o resto está lá, é interpretação tua”, explica o jovem de Aveiro. “É como fotografar natureza morta, sozinho. Adoro.” Dedica-se a retratar edifícios há seis anos mas, ao contrário de muitos dos colegas, não tem formação em arquitectura mas sim em fotografia. A partir do Ivo Tavares Studio, em Aveiro, o foco são “empresas que criam materiais para arquitectura”. “A linguagem é a mesma, os clientes também, mas aumentamos o espectro da empresa para implementar mais pessoas”, diz. Ivo, de 30 anos, nunca fotografou uma obra de um arquitecto famoso — “por uma questão de opção”, sublinha. “Trabalho ao contrário, prefiro projectos pequenos, de arquitectos não tão conhecidos mas que me dão muito mais gozo.” Para breve está a reestruturação do Archmov, um projecto de vídeo de arquitectura que o P3 apresentou no final de 2012.

Luís Ferreira Alves
Há mais de 30 anos que Luís Ferreira Alves fotografa arquitectura. Começou por ser fotógrafo amador e foi o desafio de um amigo que o levou a olhar para a área como uma oportunidade. “Em poucos meses fui obrigado a decidir entre a minha sólida situação como responsável comercial de uma grande empresa pelo desafio, sem rede, da aventura fotográfica. Decidi por esta”, contou à versão brasileira do “Archdaily” em Fevereiro deste ano. A partir do Porto, Ferreira Alves trabalha com uma assistente e “quase exclusivamente em fotografia de arquitectura, institucional e do território”. Diz privilegiar “ a luz existente, mesmo quando coexistem diferentes fontes luminosas”, com especial destaque para as obras do Prémio Pritzker 2011, Eduardo Souto de Moura. O Edifício Cantareira, o Convento das Bernardas ou o Loteamento e casas das Sete Cidades são disso exemplo.

http://p3.publico.pt/cultura/arquitectura/18229/o-trabalho-deles-e-fotografar-arquitectura





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sábado, 26 de setembro de 2015

o milho verde e a desfolhada portuguesa

* Victor Nogueira


Logo de manhãzinha oiço uma barulheira inabitual, assomo à varanda e passam tractores puxando enormes atrelados, saindo dum terreno contíguo. Vou às traseiras do quintal e assisto à apanha do milho, segado pelas ceifeiras-debulhadoras, transformado em grão e despejado num atrelado que caminha paralelo. Enchido este, outro lhe ocupa o lugar, numa faina ininterrupta e barulhenta. Pouco depois uma pequena empilhadora apanha o pouco restolho e em menos de duas horas o vasto campo está completamente "limpo", sem que ocorram as desfolhadas de outrora de que se fala no final deste post, após o registo fotográfico. O dia está de neblina, húmido e não soalheiro.


  



  
   





  
  

  












VER TAMBÉM   

A DESFOLHADA DO MILHO (1)

A desfolhada do milho é uma tradição que já perdeu alguns rituais de outrora, mas ainda permanece bem viva no quotidiano anual da aldeia.

A sementeira do milho é feita nos princípios de Maio. Quando o milho já é uma plantinha verde, o terreno é sachado para tirar as ervas daninhas. Estas já são raras devido aos produtos químicos lançados no solo. É nesta época que, vezes sem conta, os agricultores vão buscar as águas das represas. Quando o milho cresce, é-lhe cortado a bandeira que servirá de alimento aos animais. 

[Em Junho, começam as regas. Quando o milho cresce e que a espiga já começa a estar criada, cortam-se a canas, ou seja a parte que fica a seguir à espiga, que é um óptimo alimento para o gado]. Em meados de Setembro, princípios de Outubro, as espigas são colhidas. É aqui que a velha tela da tradição das desfolhadas é bem revivida como nos tempos de antigamente.

De dia, o milho é retirado dos campos e transportado, em gigas à cabeça, ou em tractores, para a eira ou a casa do lavrador. Antigamente eram utilizados os carros de bois. À noite, juntam-se os amigos, os vizinhos e os familiares para se ajudarem uns aos outros como forma de troca de trabalho. As espigas são desfolhadas, uma a uma, sendo amontoadas umas sob as outras em gigas. As gigas cheias são esvaziadas no canastro/espigueiro. Os adultos, pela noite dentro, vão contando histórias e as crianças brincando.

Antigamente a desfolhada terminava sempre com comes-e-bebes ao som de algumas canções populares. Não faltavam os petiscos gastronómicos, como a regueifa doce, as azeitonas e o vinho, que acalentava a alma de todos os que ajudassem como forma de agradecimento e de convívio. 

Actualmente, já são poucas as pessoas que retribuem alguns comes-e-bebes, é uma "pena". São estes belos e pequenos momentos, entre muitos outros, que tornam a vida repleta de alegria. Fazem-nos perceber de como os nossos antepassados, em tempos de trabalhos árduos e de fome, eram tão alegres e não se esmoreciam perante os trabalhos árduos.

Até 15 anos atrás, tinha-se também como ritual a descoberta do “milho rei”. Os mais jovens tinham sempre a esperança de encontrar milho-rei ou rainha (uma espiga vermelha) para poderem dar um beijo ou um abraço a um rapaz ou uma rapariga da qual gostassem. [Esta era uma oportunidade única para se aproximar fisicamente das raparigas , das namoradas, até das noivas porque, na época, as convenções sociais eram muitas e a vigilância por parte dos pais era muito apertada]Por outro lado, as pessoas também contam uma outra versão: quem encontrasse o milho-rei ou rainha teria que dar um abraço à pessoa que estivesse a seu lado. Quando aparecesse uma espiga sem milho significava dar um beliscão.

Actualmente o milho-rei ou rainha já não aparecem com tanta frequência, e quando aparecem, normalmente, chama-se uma criança e ela dá o beijo ou beliscão a uma pessoa.

Outrora, eram nas desfolhadas que se começavam muitos namoros. Os rapazes vinham das aldeias vizinhas e lá lançavam o seu charme a uma donzela de seu interesse. Neste cenário também surgia uma personagem chamada de curandeiro. Tratava-se de uma pessoa que aparecia no escuro sem que ninguém o visse e começava a proclamar sons e frases criticas.

(1)




Milho Verde - José Afonso


Desfolhada portuguesa, de Ary dos Santos por Simone de Oliveira



Romeiros - Ourém  - Grupo de música tradicional prtuguesa

"O milho da nossa terra" - Música e letra tradicionais



1. Milho Verde


Milho verde, milho verde

Ai milho verde, milho verde

Ai milho verde maçaroca



À sombra do milho verde

Ai à sombra do milho verde

Ai namorei uma cachopa

Milho verde, milho verde
Ai milho verde, milho verde
Ai milho verde miudinho

À sombra do milho verde
Ai à sombra do milho verde
Ai namorei um rapazinho

Milho verde, milho verde
Ai milho verde, milho verde
Ai milho verde folha larga

À sombra do milho verde
Ai à sombra do milho verde
Ai namorei uma casada

Mondadeiras do meu milho
Ai mondadeiras do meu milho
Ai mondai o meu milho bem

Não olheis para o caminho
Ai não olheis para o caminho
Ai que a merenda já lá vem


Letra e Música: Música Tradicional de Malpica, Beira Baixa, José Mário Branco e José Afonso
Álbum: Cantigas do Maio (1971)


2. Desfolhada Portuguesa (Ary dos Santos)

Corpo de linho
lábios de mosto
meu corpo lindo
meu fogo posto.
Eira de milho
luar de Agosto
quem faz um filho
fá-lo por gosto.
É milho-rei
milho vermelho
cravo de carne
bago de amor
filho de um rei
que sendo velho
volta a nascer
quando há calor.

Minha palavra dita à luz do sol nascente
meu madrigal de madrugada
amor amor amor amor amor presente
em cada espiga desfolhada.

Minha raiz de pinho verde
meu céu azul tocando a serra
oh minha mágoa e minha sede
oh mar ao sul da minha terra.

É trigo loiro
é além tejo
o meu país
neste momento
o sol o queima
o vento o beija
seara louca em movimento.

Minha palavra dita à luz do sol nascente
meu madrigal de madrugada
amor amor amor amor amor presente
em cada espiga desfolhada.

Olhos de amêndoa
cisterna escura
onde se alpendra
a desventura.
Moira escondida
moira encantada
lenda perdida
lenda encontrada.
Oh minha terra
minha aventura
casca de noz
desamparada.
Oh minha terra
minha lonjura
por mim perdida
por mim achada.

Simone de Oliveira interpreta "Desfolhada" no Festival RTP 1969, classificando-se em 1º lugar com 94 pontos.

3,
Milho verde, milho verde  
Ai milho verde, milho verde 
Ai milho verde, maçaroca.
À sombra do milho verde
Ai à sombra do milho verde
Ai namorei uma cachopa

.
Milho verde, milho verde
Ai milho verde, milho verde
Ai milho verde, miudinho
À sombra do milho verde
Ai à sombra do milho verde
Ai namorei um rapazinho
.
Mondadeiras do meu milho
Ai mondadeiras do meu milho
Ai mondai o meu milho bem
Não olhais para o caminho
Ai Não olhais para o caminho
Pois a merenda já lá vêm
.
O milho da nossa terra,
ai, o milho da nossa terra,
é tratado com carinho.
É a riqueza do povo,
ai, é a riqueza do povo,
é o pão dos pobrezinhos.




terça-feira, 22 de setembro de 2015

embarcações no rio sado

* Victor Nogueira


foto victor nogueira - alcácer do sal - embarcações no rio sado